No mundo corporativo, todos falam em ESG, que prega juntar forças para solucionar problemas comuns e construir um mundo melhor. Nos eventos e congressos só se fala em bem comum e em trabalhar em harmonia. Muitos autores andaram recentemente publicando livros enaltecendo o líder humano, o chefe compreensivo, o ambiente de trabalho diverso e inclusivo. A mídia só fala em tolerância e diversidade. Todo mundo parece caminhar no sentido da civilidade e do bom senso.

Aí vem a política e destrói tudo

Apesar dos dois séculos de vida independente, o Brasil viveu pouco mais de 100 anos não contínuos em regime democrático. É tão pouco tempo que nossa sociedade só agora começa a amadurecer politicamente. Nunca votamos em ideologia mas isso está mudando.

Quando a gente olha para os países mais desenvolvidos, percebe-se que alguns deles estão polarizados em apenas duas correntes muito claras: o centro-esquerda e o centro direita. É o caso dos EUA com seus democratas e republicanos e do Reino Unido com os trabalhistas e os conservadores. Em outros, temos 4 partidos, sendo um de extrema-esquerda, outro de centro-esquerda, um de centro e outro de centro-direita. É o caso da Alemanha, França e Itália. Nestes últimos vem florescendo um quinto partido, o de extrema-direita. Em todos estes países, as pessoas se identificam com a ideologia e o programa de governo proposto por cada partido, e não pelo candidato em si. Em lugar algum, nem mesmo os partidos mais radicais pregam a eliminação da democracia, ditadura, redução de liberdades individuais, cerceamento da imprensa ou coisas do tipo.

O Brasil saído da ditadura ficou votando em um “centro amorfo” por 3 décadas. Mesmo Lula, para ser eleito, se apresentou como moderado, em sua famosa Carta à Nação de 2002. Mas, finalmente começamos a votar em ideologia. O movimento que se iniciou em 2018 e se consolidou este ano indica claramente que parte da sociedade é conservadora e parte é progressista, independentemente do candidato. Todo o miolão amorfo, povoado por muitos partidos, a maioria oportunistas, vem se esfacelando.

Muita gente acha essa polarização péssima. Brigas correm soltas nas redes sociais e também nas relações pessoais. Amizades antigas são comprometidas. Relacionamentos são rompidos. Pais e filhos se estranham.

No entanto, eu acredito que o que a gente está vendo é o início do processo que nos levará, daqui a algumas décadas, a ser como os EUA ou os países europeus. À medida em que uma sociedade jovem e imatura abandona o centro amorfo e toma partido ideológico, ela tende a radicalizar. A sociedade brasileira se comporta como os adolescentes, reagindo com emoção exagerada a tudo o que é importante. A radicalização política atual espelha o nosso primitivismo e imaturidade. Com o tempo, se abrandará. Propostas políticas passarão a ser mais importantes do que o nome em si dos candidatos. A ideologia de esquerda se consolidará em torno ao que se conhece como centro-esquerda, enquanto que o conservadorismo se fixará no centro-direita. Propostas radicais, tanto de um lado quanto de outro, desaparecerão com o tempo. Os “riscos “a democracia” sumirão, assim como propostas de controle de mídia, eliminação do STF, invasão de terras, aprisionamento de pessoas por expressarem pontos de vista extravagantes e outros absurdos similares .

A radicalização do jogo político é parte do penoso processo de amadurecimento que nossa sociedade precisa experimentar para que o país prospere.

Como tudo isso leva décadas, é preciso bom senso para que a guerra política atual pare de contaminar as relações pessoais, as amizades, as famílias, os colegas e a sociedade como um todo. Brigar por ideologia é bobagem. Nenhum candidato lhe conhece. Se você tiver um enfarte após discutir acidamente com alguém, nenhum político ficará sabendo ou sentirá qualquer coisa por você. Então, pare com isso. Sua ideologia irá ganhar e perder eleições ao longo do tempo. Assim é a vida em democracia, assim o Brasil será e não faz qualquer sentido você se perturbar por isso.