por Fabio Nogueira | ago 16, 2012 | Blog
Crises são ótimas para induzir empresas a inovar e assumir riscos. Em 2009, o Carrefour anunciou a transformação de 500 hipermercados europeus do formato clássico (que ele próprio inventou) para um modelo modernizado e batizado de Planet. A aposta era alta. A um custo de US$ 7 milhões por unidade, a direção do Carrefour esperava que as vendas aumentassem 18% em 5 anos. Por razões que não são foco deste artigo, o Carrefour só conseguiu transformar 81 unidades, porém as vendas aumentaram 14% nelas. Crescer vendas nesta magnitude sem aumentar área de exposição, em mercados maduros e em recessão pode ser classificado como um resultado excepcional.

O modelo do hipermercado vem sendo declarado morto há um bom tempo. O varejo adora discutir os diversos riscos que os hipermercados tem de enfrentar, de lojas de desconto a redes especializadas ,de lojas de departamento a supermercados de bairro, de atacarejos ao e-commerce. O fato é que os hipermercados tem desempenho diferente dependendo do país mas existem em todos eles. Mesmo dentro de um mesmo país, os consumidores estabelecem relações diferentes com o hipermercado. No caso brasileiro, em locais onde o trânsito é mais suave e dispõe-se de mais tempo, ir ao hipermercado chega a ser um passeio. Já em São Paulo é uma terrível obrigação da qual todos adorariam se ver livres. De modo geral, as pessoas consideram o hipermercado o melhor local para as grandes compras do mês enquanto o supermercado, ou as lojas de bairro, tem o papel de complementar a despensa com as compras semanais.

O Carrefour Planet parte do pressuposto que o consumidor estava mesmo cansado da insipidez e do tédio na experiência de compras no hipermercado. É preciso lembrar que cerca de 50% do espaço de venda em um hiper é dedicado a alimentos e escolher alface e peito de frango não é exatamente uma atividade prazerosa. Então o que fazer?

O Carrefour repensou praticamente todas as variáveis relacionadas ao negócio. A primeira medida foi reagrupar as categorias de produtos nos chamados “universos”, ou soluções de consumo. Grosso modo, é como se fossem lojas dentro de lojas, aproximando o hipermercado do modelo “loja de departamento”. Não existem as paredes mas existe a clara separação entre um “universo” e outro. Uma mesma categoria de produto pode aparecer em mais de um “universo”.

Um segundo aspecto exaustivamente trabalhado foi o conforto do cliente. A iluminação branca genérica, típica de mercados, foi substituída por iluminação dirigida aos produtos, o que baixa o nível geral de claridade e destaca a mercadoria. Outro destaque é a inclusão de poltronas e locais de descanso, principalmente onde a seleção do produto demanda tempo (como na livraria). As cores utilizadas em cada universo guardam relação com o tipo de mercadoria ou de solução de consumo. O espaço da Heineken é verde, obviamente. Já a livraria tem tons neutros e o espaço para as crianças é multicolorido.

A filosofia básica é a de valorizar o cliente. Por conta disso, o conceito de puro auto-serviço foi deixado um pouco de lado. Consultores de venda estão espalhados por toda a loja para auxiliar os clientes. Na área de beleza é possível cortar o cabelo ou ter o rosto maquiado. Há espaços para degustação de produtos.

Um ponto que a mim não ficou claro é se houve ou não avanço no check-out. Qualquer varejista sabe que o cliente pode gastar duas horas passeando dentro da loja sem se cansar. Se ele ficar mais do que 10 minutos na fila do caixa, ele se irrita e pode até largar o carrinho cheio. O varejo inventou muitas saídas para o problema, desde a implantação de caixas rápidos até o reforço de bocas de ar condicionado sobre os caixas. Porém, o drama persiste. Teoricamente, só há uma solução real para este problema: as etiquetas inteligentes, permitindo um “sem parar” na saída. Ambos já existem, as etiquetas e os sistemas de leitura e registro da compra. Mas há problemas tecnológicos que precisam ser resolvidos antes da implantação em larga escala no varejo. Ainda somos reféns do “velho e bom” check-out, com as atendentes passando produto pelo leitor enquanto pensam na vida.
Uma unidade experimental do Carrefour Planet (embora sem usar esse nome) está em operação desde o final de 2011 na cidade de Santo André, na Grande São Paulo. Será este o futuro do hipermercado?

A D.D é uma butique de consultoria voltada para assuntos gerenciais e estratégicos com 17 anos de experiência no mercado brasileiro. Nossa carteira de clientes inclui varejistas de grande e médio portes, bem como manufaturas e prestadoras de serviço
por Fabio Nogueira | jul 26, 2012 | Blog
A mídia publica incessantemente matérias sobre franquias e franqueados. Quase sempre, o enfoque é no franqueado. Em outras palavras, a mídia de negócios procura ajudar o potencial investidor a escolher uma franquia.
O que nos interessa neste blog é o outro lado da moeda: é interessante franquear o negócio? Eu tive essa experiência no passado recente e posso garantir que há riscos elevados com franquia. E outra, franquia só dá dinheiro depois que você conseguiu montar uma rede grande.
Vamos por partes. Primeiro, é impossível franquear um modelo de negócios que não esteja consolidado. O negócio precisa estar dando certo para ser possível convencer alguém a investir; e também para que seja possível você dizer a seu franqueado como tocar a franquia dele. Alguém dirá que surgem franquias do nada o tempo todo. Sim, surgem. Há oportunismo no mercado. Existem investidores que se especializaram em buscar ideias novas, montar dois ou três quiosques (geralmente isso ocorre com quiosques) em shoppings de altíssimo movimento, e depois de alguns meses saem ofertando a franquia país afora. Muita gente se fascina com a novidade, os resultados dos primeiros empreendimentos são sempre muito bons e acaba comprando a ideia. É oportunismo empresarial válido mas a maioria dos negócios não segue essa lógica.
O segundo ponto importante é que nem todos os negócios tem margem suficiente para acomodar mais um elo na cadeia: o franqueado. Grosseiramente falando, a unidade franqueada é como um ponto de venda seu. Ela deve ter margem suficiente para permitir ao franqueado recuperar o investimento feito. Normalmente, esse dinheiro remunera o investimento que o franqueador faria se a loja fosse dele. Então o que ganha o franqueador? ganha a taxa de franquia (uma vez só) e os tais 6% sobre faturamento. Seria um resultado relativamente pobre por si só. Mas se você considerar que é necessário montar uma equipe de apoio a este franqueado e que ele telefonará a qualquer hora do dia ou da noite para resolver todo e qualquer problema que surgir, os 6% evaporarão rapidamente.
Há duas saídas para isso. Se você produz o que vende, a primeira maneira é obter margem no fornecimento ao franqueado. É meio malandro porque não muda a lógica da rentabilidade da cadeia e adiciona imposto em cascata mas é uma maneira de contornar restrições legais e apurar uma margem melhor. A segunda maneira de ganhar dinheiro é indireta. Fornecedores de mercado oferecem descontos maiores por volume, existem verbas de marketing cooperado, bonificações e uma série de práticas comerciais entre fornecedores e clientes que só ocorrem quando se atinge um determinado porte (aqui medido por volume de compras). Então, obviamente, se você passa de 10 lojas próprias para 50 lojas entre próprias e franqueadas, existe beneficio na ponta da compra apropriado pelo franqueador.
Isso nos conduz ao terceiro ponto. Só faz sentido franquear o negócio se for para criar uma rede realmente grande. Ter meia dúzia de franqueados é uma dor de cabeça. Ter 60 franqueados traz vantagens porque dilui os custos adicionais acima mencionados, além de apropriar os ganhos de escala.
Franqueados não tem obrigação de resolver problemas com sistema fora do ar, mercadoria entregue fora do prazo, dificuldades logísticas com doca de shopping center, alterações fiscais, mudança na taxa cobrada pela administradora de cartão de crédito, etc. Ele também precisa ser treinado em todos os detalhes da operação. Tudo isso faz parte do treinamento usual de um gerente de loja mas o franqueador não é um gerente. Ele é um empresário com comportamento próprio. Enquanto um gerente procura resolver todos os problemas antes de acionar a estrutura corporativa, o franqueado se acha no direito de acionar a estrutura do franqueador por qualquer coisa. Sem entrar no mérito se isso é certo ou errado, o fato é que um comportamento humano esperável, e isso impõe pressão sobre o back-office da empresa.
Outro aspecto é que , como empresário, o franqueado tem a ambição normal de ser dono do próprio negócio, ou seja, de dar a ele seu toque pessoal. É difícil estabelecer os limites disso. Se o franqueador proibir qualquer iniciativa do franqueado, poderá desestimulá-lo (e não há nada pior do que uma loja sem gestão). Mas se deixar a coisa correr solta, poderá perder controle sobre o posicionamento e imagem do negócio, dois de seus principais ativos. Um dos fatores de seleção do franqueado é justamente a personalidade dele e a empatia que ele gera com o franqueador. Afinidades culturais, em suma.
Eu tentei implantar o modelo de crescimento via franquia para o negócio de confeitaria fina da minha família e desisti. Foram vários os motivos. Eu não tinha um modelo de negócios replicável. Doces finos precisam ser produzidos próximos da hora do consumo. O franqueado teria de produzir os próprios doces sem a nossa supervisão direta. O risco de ocorrer problemas era muito alto. O segundo motivo é que a margem não permitia remunerar adequadamente o franqueado. A terceira razão é que nós descobrimos que nosso negócio é de nicho e de serviços. Muitas pessoas entravam nas lojas perguntando sobre fornecimento para festas, alterações na decoração dos doces, mudanças nas embalagens de presentes, redução de preço para grandes encomendas, doces específicos para celebrações corporativas, etc. Eu percebi que nós apropriávamos margem muito maior voltando ao modelo convencional de ateliê de alta confeitaria, operando com baixo volume e alta margem, do que montando uma rede de lojas pelo país, tentando ganhar na escala e no produto padronizado. A escolha foi feliz e eu estou satisfeito por não ter ido adiante com a rede.
por Fabio Nogueira | jul 19, 2012 | Blog
A economia brasileira enfrenta o fim de um ciclo de crescimento baseado em crédito abundante, exportações crescentes e políticas assistencialistas. Infelizmente, o país não aproveitou sua década de prosperidade para investir no que certamente garantiria nossa prosperidade a longo prazo: educação, infra-estrutura e tecnologia. Agora, com o encerramento deste ciclo, a maior parte dos empresários se pergunta o que irá acontece com o mercado das classes C e D (que explodiu em anos recentes), com a venda de artigos de maior valor unitário (largamente dependente de crédito) e com o crescimento do consumo como um todo.
Muitos economistas buscam respostas a estas perguntas. Este blog caminha em outra direção e se pergunta quais são as tendências de consumo de longo prazo que se cristalizaram neste período e para as quais não existe nenhuma perspectiva de reversão. Em outras palavras, que oportunidades se abrem para o varejo, independentemente das oscilações econômicas de curto prazo.
Há um estudo atualizado anualmente pela empresa de pesquisa Macroplan, do Rio de Janeiro, que busca identificar estas tendências. A edição deste ano do estudo, disponível para consulta na internet, identifica 10 tendências que vieram para ficar. O texto a seguir incorpora comentários e análises da D.D Consultoria nas tendências originalmente mapeadas pela Macroplan.
- Consumo prático: Cerca de 12% dos domicílios brasileiros são habitados por uma única pessoa, praticamente o dobro do existente no ano 2000. O número absoluto de pessoas morando sozinhas tende a continuar aumentando nas próximas décadas. Porções individuais, elevada praticidade e serviços de conveniência são cada vez mais adequadas a esse segmento. Deve-se também esperar desse consumidor menos tempo de permanência no domicílio e mais vida social e esportiva
- Consumo +60: daqui menos de duas décadas o número de pessoas com mais de 60 anos terá passado dos atuais 20 milhões para 40 milhões de pessoas. Pessoas com mais idade tendem a consumir produtos alimentícios mais saudáveis, gastam mais com saúde, medicamentos e turismo, despendem bastante tempo com entretenimento e, na média, provavelmente viverão até os 80 anos. A infra-estrutura de loja precisa ser adaptada, evitando luzes, sons e espelhos em demasia, bem como escadas e objetos que interfiram na passagem. Se o chão de loja permitir, instalar banquinhos para breves períodos de descanso contribuirá para aumentar o tempo de permanência do consumidor na loja.
- Consumo exigente: à medida em que a sociedade brasileira vai amadurecendo, aumentam os requisitos por diversos atributos dos produtos consumidos, incluindo sua origem, atendimento a padrões mínimos de qualidade, atendimento à todas as exigências legais e normas técnicas, laudos independentes de performance, etc. Alguns desses atributos se estendem ao ponto de venda. Aumento de padrão de exigência é algo com que convivemos diariamente desde sempre. O importante é oferecer uma resposta rápida às exigências ou reclamações dos consumidores. Há uma parcela crescente do público que leva esses quesitos em consideração na hora de escolher o varejista
- Consumo responsável: sustentabilidade ainda é assunto restrito a uma parcela mais esclarecida e antenada do público consumidor. Mas o tema é importante e deverá ganhar cada vez mais relevância. Sustentabilidade é um daqueles assuntos onde o consumidor se torna consciente em função da própria movimentação dos fabricantes e varejistas, bem como da mídia. Seja por conta de maior educação do consumidor, seja para acompanhar as ações da concorrência, procure destacar atributos de sustentabilidade de seu negócio ou dos produtos que você vende. Pequenas ações, como instalar um sistema de iluminação econômica na loja, poderão impactar positivamente na imagem da empresa.
- Consumo saudável: é visível o aumento da preocupação com um padrão de vida saudável, que se reflete em diferentes hábitos de vida. Não só deve crescer a demanda por produtos com baixas calorias, gorduras, aditivos e conservantes industriais, como todo um modelo de vida outdoor deve ganhar corpo, explorando o clima favorável de boa parte do país e a inevitável troca do automóvel pela bicicleta.
- Consumo online: já bastante debatido, o consumo online continua crescendo a taxas de dois dígitos e agora se prepara para tirar proveito do celular e dos tablets. Conciliar o varejo online com o varejo offline é o grande desafio dos próximos anos.
- Consumo precoce: oitenta por cento das crianças brasileiras influenciam, em alguma extensão, as decisões de compra dos pais. Essa tendência é universal. Nos EUA, a publicidade dirigida à criança aumentou 170 vezes em 25 anos. As crianças procuram e tem acesso a um volume inimaginável de informação, formando opinião e gerando demanda em idades cada vez mais precoces. Não é incomum ver pais e mães, dentro das lojas, mudarem sua decisão de compra após escutarem os filhos. Varejistas que tem como público alvo adultos na faixa dos 30 a 40 anos com filhos pequenos a tiracolo devem ter em conta que a comunicação de ponto de venda e a publicidade precisarão atingir todo o núcleo familiar para serem eficazes.
- Consumo em nichos: segmentação de mercado é um conceito antigo de marketing e naturalmente praticado por todos os varejistas. A diferença agora é que diversos nichos específicos de consumidores, antigamente pequenos em tamanho ou de baixíssima visibilidade, ganharam expressão econômica. Aqui se incluem os nichos religiosos, sexuais e étnicos. E também os menos polêmicos nichos de apreciadores da natureza, ex-fumantes, migrantes, pessoas com sobre-peso, cultuadores de novelas, etc. O consumidor de nicho se sente valorizado e tende não apenas a gastar mais como reconhece valor no varejo especializado, permitindo ao varejista capturar esse valor na forma de margens de lucro mais altas. Uma sociedade que enriquece tende a gerar cada vez mais mercados de nicho.
- Consumo exclusivo: o mercado do luxo é específico e cheio de armadilhas. Não é nada fácil conquistar esse tipo de consumidor. Mas, mesmo aqui, há segmentos. O rico tradicional, de família antiga, tem um perfil de consumo bastante diferente do novo rico ou do rico de baixo grau de instrução. Seja como for, da mesma forma que se criou um mercado de classe média com pessoas que subiram na pirâmide social vindos das classes D e E, o segmento da Classe A também foi alimentado por pessoas que migraram da classe B. Esse movimento ascencional alimentou as aspirações pelo consumo de artigos mais sofisticados e o mercado do luxo vai muito bem no Brasil, sem sinais de que possa perder ímpeto nos próximos anos.
- Consumo de baixa renda: aqui temos o problema. Trinta milhões de pessoas subiram das classes D e E para as classes imediatamente superiores. Toda essa tropa entrou no mercado buscando tanto de bens de consumo imediato quanto bens duráveis. O crédito ajudou e as vendas de eletrodomésticos e automóveis, por exemplo, bateram recordes históricos. Quantos conseguirão manter seu novo perfil de consumo caso a recessão atual se aprofunde? Esse segmento de consumidores é extremamente heterogêneo. Inclui desde famílias cujos membros obtiveram melhores empregos graças à escassez de mão de obra até informais da periferia que prosperaram em seus micro-negócios. É completamente impossível avaliar, com um mínimo de precisão, o que acontecerá nos próximos 20 anos com este segmento de consumidores. Do pouco que se pode prever, é de se destacar o caráter utilitarista que as pessoas dão ao consumo (ou seja, privilegia-se a melhor relação custo-benefício), a atenção a casa (tanto o imóvel quanto os equipamentos domiciliares), melhoria nos cuidados pessoais e, principalmente, melhor alimentação. É um consumidor arredio também. Ao menor sinal de risco de perda de emprego ou queda de renda, preferirá adiar o consumo e guardar o dinheiro. Resta saber o que acontecerá com o tradicional carnê. A inadimplência vem aumentando fortemente no país, tornado os concessores de crédito muito seletivos. Curiosamente, os mais pobres costumam ser os menos caloteiros, já que restrições ao seu nome podem lhe causar prejuízos significativos. Ainda assim, o desemprego ceifa a renda e impede o cumprimento das obrigações. Ninguém sabe o tamanho do ajuste que este país precisará passar nos próximos anos, e nem se o governo atual deseja fazê-lo. Diz um velho ditado que é melhor um fim terrível que um terror sem fim. Esperemos que o nosso governo, em suas várias instâncias, pense da mesma forma.
por Fabio Nogueira | jul 12, 2012 | Blog
Quando, alguns anos atrás, eu comentei com amigos que estava para abrir lojas em 3 shoppings de primeira linha daqui de São Paulo, fui fortemente desaconselhado. O primeiro, dono de uma franqueadora com mais de 160 cafés, me mostrou seus números e disse que operar em shopping simplesmente mata a rentabilidade de negócios com baixa margem. Daí a razão pela qual pouquíssimas das suas 160 franquias estavam em algum Shopping Center. Meu negócio da época também era alimentos e os números dele me impressionaram.
Não satisfeito com uma recomendação, consultei o diretor financeiro de uma rede de lojas de material esportivo. Este foi menos taxativo. Sua opinião era que “depende muito do shopping”. Pensei com meus botões que esta é a típica resposta de consultor, algo que eu conheço bem, já que pertenço à estirpe. Depende do que? Do fluxo de pessoas, do perfil do frequentador, da sazonalidade, da evolução do entorno do shopping, do mix de lojas, do perfil da administradora, da posição física da minha loja no shopping, da negociação feita, do estágio de maturidade do empreendimento, etc, etc. Se o primeiro tinha sido uma ducha de água gelada, esta segunda opinião foi só uma duchinha de água fria.

O terceiro amigo consultado era (e ainda é) alto executivo de uma multinacional industrial. Varejistas são seus clientes e eu não esperava que ele conhecesse muito de loja. Ocorre que ele também vestia o chapéu de “paitrocinador” de uma pequena rede de lojas de confecções que suas filhas tocavam. Ao longo da vida eu aprendi a respeitar muito a opinião de industriais. A vida na manufatura é muito mais previsível do que no varejo e o profissional da área tende a raciocinar de maneira cartesiana, deixando percepções e intuições em segundo plano. Sua resposta à minha consulta foi que quem ganha dinheiro em shopping é a administradora.
Ao fim e ao cabo, mais motivado pelo meu desejo de experimentar algo totalmente novo do que desmotivado pelas recomendações em contrário, abri as lojas. E a realidade mostrou que todos tinham um pouco de razão embora as cores estivessem tingidas por tons fortes demais.
Juntando a experiência dessas lojas com a de longos anos em consultoria gerencial, minha conclusão é a seguinte:
- Ter loja em shopping é celebrar um casamento. Como todo casamento, é mais barato entrar do que sair. Os contratos com administradoras de shopping impõem cláusulas muito onerosas para você se desvencilhar de um ponto. Se as coisas não estiverem indo bem, prepare-se para perder muito dinheiro com a operação ou para pagar muito à administradora para sair do local.
- Todo shopping acaba dando certo. Porém, os shoppings novos demoram pelo menos três anos para formar clientela (ou, usando a expressão correta, estabilizar a frequência e o volume de público) e nem todos os negócios darão certo. De 10 a 15% das lojas não se mostrarão viáveis já no primeiro ano. Shoppings costumam refinar o mix de lojas após os primeiros 12 meses. Algumas serão realocadas para pontos mais adequados. Outras precisarão sair. Este é o único momento onde se pode negociar um way out razoável.
- Tenha reservas financeiras suficientes para 3 anos de operação deficitária. Pode demorar menos para equilibrar o caixa? Pode. Também pode demorar mais. Ninguém sabe. E não cometa o erro de abrir várias lojas simultaneamente, a menos que você esteja franqueando o negócio ou tenha uma fonte de recursos muito capitalizada com você – um fundo de private equity, por exemplo.
- Encontrar mão de obra qualificada é uma enorme dificuldade. Infelizmente, o comércio ainda é visto como alternativa para quem não tem opção de emprego melhor. Tipicamente, as pessoas que se apresentam em um processo seletivo possuem limitações sérias na educação formal e na educação básica. Isso quando aparecem na entrevista. Ou quando aceitam o emprego mas não aparecem para o registro porque “surgiu um emprego mais perto de casa”. Além da qualificação, shopping opera 7 dias por semana, 365 dias por ano, das 10 da manhã às 10 da noite. São dias e horários inconvenientes para todo mundo. A menos que você possa pagar salários superiores à média de mercado, trabalhar em shopping não fará parte da escolha primária de emprego de ninguém com um pouco de qualificação.
- A quinta lição aprendida foi quanto ao custo de locação. Há uma regrinha empírica na vida em Shopping Center que diz o seguinte: as grandes âncoras pagam muito pouco de locação (vi o caso de uma que pagava apenas 2% do faturamento, sem valor mínimo). Elas são fundamentais para gerar tráfego. As lojas de franquia também tem tratamento diferenciado. Afinal, elas estão presentes em todos ou quase todos os shoppings da administradora, são importantes no mix e a administradora aceita conversar. Quem realmente “carrega o piano” são os pequenos lojistas. A estes as regras são impostas e há pouco espaço para choro. Mesmo assim, negocie o máximo que lhe for possível. E quando não der mais para negociar, negocie mais um pouco. Lembre-se que você está entrando em um casamento. Quaisquer dois por cento hoje, somados ao longo de 5 ou 10 anos de operação de loja, farão muita diferença.
- Por fim, embora as pessoas continuem trocando o comércio de rua pelo comércio concentrado, a superlotação de shoppings em algumas cidades está comprometendo a rentabilização dos novos empreendimentos. Recentemente eu participei de uma reunião entre grandes varejistas onde se discutiu o dilema entre estar em um shopping novo, sabendo que abrirão outros 2 ou 3 na cidade e todos sofrerão, ou abrir mão da oportunidade e ver o espaço ocupado por um concorrente. Muitos destes varejistas declararam que é melhor crescer menos mas com segurança do que tentar assegurar todos os pontos comerciais possíveis e estourar o caixa ou o endividamento.
Minha recomendação para você que é pequeno varejista é que entre em um shopping de cada vez, procure empreendimentos maduros, tenha muita reserva para sustentar alguns anos de operação deficitária, e só invista na próxima loja quando a primeira já estiver gerando caixa positivo. Se você for um franqueador, seja honesto com seu franqueado e lhe diga que o céu azul de brigadeiro com que todo mundo sonha está depois do mar de nuvens. E se você for um grande varejista, esprema a administradora e tente obter condições extremamente favoráveis.

Em tempo: eu, ainda noviço na arte de negociar com administradoras de shopping, e abrindo minha primeira loja, fechei o contrato por 30% do valor do metro quadrado inicialmente solicitado. Depois de algum tempo, com o negócio indo mal, consegui uma redução adicional nos custos de locação. Imagine o que eu teria obtido se tivesse um pouco mais de experiência nas costas.
A D.D é uma butique de consultoria voltada para assuntos gerenciais e estratégicos com 17 anos de experiência no mercado brasileiro. Nossa carteira de clientes inclui varejistas de grande e médio portes, bem como manufaturas e prestadoras de serviço
por Fabio Nogueira | jul 5, 2012 | Blog
Durante algum tempo na minha vida eu deixei de lado o escritório de consultoria e assumi o comando da empresa de doces artesanais da minha família, que operava na ocasião uma pequena rede de confeitarias próprias. Essa experiência me ensinou muitas coisas mas duas lições foram as mais importantes. A primeira é que a teoria é bem mais simples do que a prática. A outra lição é que doce vende menos por qualidade e mais por apresentação. É frustrante você ter uma empresa onde todos estão extremamente preocupados com a qualidade dos produtos enquanto seu público está muito mais interessando no design da loja e na apresentação dos quitutes.

Como não se briga com o cliente, metemos o orgulho na mala e fomos procurar inspiração por ai. Foi quando descobrimos a Dylan´s Candy Bar, uma pequena rede de lojas originária de Nova Iorque e que há 10 anos vem lentamente se espalhando pelos EUA.
A Dylan´s não fabrica doces. Ela os compra de fornecedores do mundo todo. Sendo assim, a maior parte do que ela vende é igual ao que se pode comprar em qualquer outra loja. Então onde está a diferença? Está na experiência de compra, essencialmente.
Vender sonho é uma especialidade da família da dona da loja. A Dylan´s pertence à Dylan Lauren, filha de Ralph Lauren, que absorveu de seu pai toda a experiência em design e construção de ambientes lúdicos. Sua candy store é uma graça e resulta de uma arriscada porém extraordinariamente bem montada mistura de arte, cultura, moda e doces.
A loja de 1.400 m2 é composta por 3 andares, sendo dois de exposição de produtos e um misto de cafeteria e área de eventos no terceiro piso. A decoração é animada, super colorida e permite a oferta de 7.000 itens diferentes. Quem já trabalhou com confeitaria sabe que 80% da clientela de uma loja de doces é composta por mulheres. Os homens não se sentem a vontade e nem são grandes consumidores de doces. As crianças ficam tão assanhadas que transformam a loja em um playgroung. Quem realmente decide e compra é a mulher. E a Candy´s é uma loja para mulheres, apesar do jeitão infanto-juvenil.
A Dylan´s não trabalha necessariamente com itens de confeitaria fina. Muitos de seus produtos são fornecidos por marcas industriais comuns, como Hershey´s, M&M, Wonka e semelhantes. O marketing e a apresentação é que valorizam o produto. Há uma espécie de Hall of Fame em um canto da loja, que destaca os doces preferidos das celebridades. A loja já serviu de pano de fundo para séries de televisão e filmes famosos. É um point turístico conhecido e há sempre alguma coisa acontecendo para chamar a atenção
A rápida valorização da marca ao longo dos primeiros anos permitiu à Dylan´s enveredar por segmentos de mercado conhecidos por serem hiper-disputados e de margens baixas, como o de festas particulares. Você terá de desembolsar pelo menos U$ 1.000 se quiser convidar duas dúzias de pessoas para sua charmosa festinha em uma das salas do terceiro piso.
Um outro braço de diversificação, obviamente inspirado na vida empresarial pregressa da família, foi a introdução de artigos de moda como botas, sapatos, bolsas, camisetas, guarda-chuvas e chinelos. Mais recentemente veio a linha de beleza: loções corporais, cremes, gel para corpo, gel para banho, esfoliantes e hidratantes labiais. Foi uma aposta de risco. Ninguém associa guloseimas com cosmética. Na verdade, quando se define a distribuição de lojas em um shopping center,por exemplo, tenta-se afastar lojas de doces de produtos de cosmética e drogarias porque doce é normalmente associado com “engordar” ou com diabetes. Mas foi esse o caminho escolhido pela Dylan´s, e tudo indica que funcionou.
O curioso lay-out da loja organiza os produtos nos seguintes departamentos:
- Novelty: presentes para o lado infantil que todo adulto possui, como telefones em forma de doce e biquínis comestíveis
- Chocolate: provenientes do mundo inteiro
- Nostalgia: revival de produtos que não estão mais nas lojas mas são fabricados com exclusividade para a DYLAN’S
- Dylan’s Candy Bar Re-Treat™: cosméticos com aromas e cheiros relacionados com os dos demais produtos da loja
- Apparel: camisetas, bonés, chapéus, pijamas, botas, sacolas, bolsas e guarda-chuvas
- Café: onde é possível degustar deliciosos sundaes, cupcakes, iogurtes, sorvetes e outras bebidas a base de café, preparados a partir de receitas próprias
- Private Party Rooms: os ambientes localizados no terceiro andar da loja para festas particulares ou corporativas
Não há dúvida que a Dylan´s capitalizou muito bem dois atributos que faltam à maioria dos demais empresários: um sobrenome famoso e farto dinheiro para investir. Mas a ousadia que deu certo na mais famosa loja de doces de Nova Iorque pode certamente servir de inspiração para outros empreendedores

Fondue de chocolate, na cafeteria da Dylan´s
A D.D é uma butique de consultoria voltada para assuntos gerenciais e estratégicos com 17 anos de experiência no mercado brasileiro. Nossa carteira de clientes inclui varejistas de grande e médio portes, bem como manufaturas e prestadoras de serviço